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segunda-feira, 6 de maio de 2013

Não, de Pablo Larraín (2012)

Ao quarto filme o chileno Pablo Larraín volta a dar provas de ser um dos cineastas actuais a ter debaixo de olho. Se «Tony Manero» e «Post Mortem» já tinham sido obras bastante recomendáveis, sobretudo a primeira, o talento de Larraín explodiu no ano passado com «Não», um filme sobre a campanha política que afastou Pinochet do Governo no Chile e abriu as portas à democracia naquele país, depois de 15 anos de ditadura militar. Além de ser um excelente estudo sobre os meandros da propaganda política na década de 1980, «Não» é um retrato dos últimos dias de um regime, através do olhar de um publicitário que a princípio não quer estar ligado a questões políticas, mas acaba por se ver envolvido no olho do furacão ao tomar as rédeas de uma campanha destinada a defender o voto no Não num referendo criado pelo governo chileno para legitimar o poder de Pinochet.

Candidato chileno na última edição dos Óscares ao galardão de Melhor Filme Estrangeiro (acabaria por perder para «Amor», de Michael Haneke), «Não» podia ficar-se pelo simples retrato histórico de uma época. E a utilização de uma fotografia que faz lembrar o vídeo (efeito que vimos recentemente num outro filme completamente diferente: «Computer Chess», de Andrew Bujalski) está lá para isso, para nos relembrar que o filme 'é' daquela época. Mas não, vai muito mais além do simples retrato histórico. Não é só a representação do que aconteceu de ambos os lados da campanha, com especial enfoque na campanha de oposição à ditadura militar chilena que pensava estar a defender uma causa perdida à partida. Há todo um universo paralelo que volta a ser explorado por Pablo Larraín, tal como fizera nos seus filmes anteriores, que lhe deram fama.

Neste caso «Não» parte da campanha para nos mostrar o que se passava no Chile naquela altura e é curiosa a relação entre o protagonista René (Gael Garcia Bernal) e Lucho (Alfredo Castro, habitual colaborador de Larraín com mais uma excelente interpretação, apesar de não ser o protagonista, como acontecera nos dois filmes anteriores do realizador), o chefe da agência publicitária para quem o jovem trabalha e que acaba por ter um papel de relevo na campanha do Sim devido às suas relações com o governo de Pinochet. É esta relação que acaba por ser a outra face do filme e que vai culminar numa sequência final, também ela bastante curiosa e que faz espelho com a abertura, em que ambos apresentam uma nova campanha publicitária e um deles diz «agora o Chile já está preparado para uma coisa destas», algo que não acontecia na primeira campanha a um refrigerante, onde a presença de um mimo, um elemento de certa forma alegre, era bastante criticada. E o olhar desencantado de René antes de entrar o genérico final (o olhar de alguém desiludido, ficamos com essa sensação) é de uma força tremenda, dando a «Não» uma nova panóplia de leituras até então escondidas com o rabo de fora.

Classificação: 4/5

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Moonrise Kingdom domina primeira edição dos prémios CCOP

Foram conhecidos esta semana os vencedores da primeira edição dos Prémios CCOP, uma iniciativa anual do Círculo de Críticos Online Portugueses (CCOP), do qual o Shut up and watch the movies faz parte, destinada a premiar os melhores filmes estreados comercialmente durante o ano anterior. O grande vencedor da edição 2013 dos CCOP foi «Moonrise Kingdom», de Wes Anderson, que conquistou cinco dos 20 prémios em competição: Melhor Filme, Melhor Argumento Original, Melhor Elenco, Melhor Banda Sonora e Melhores Valores de Produção. «Vergonha», de Steve McQueen, foi outro dos filmes em destaque nos prémios CCOP 2013 ao vencer em quatro categorias: Melhor Actor (Michael Fassbender), Melhor Actriz Secundária (Carey Mulligan), Melhor Cena (esta) e Melhor Fotografia (ex-aqueo com «Millennium 1 – Os Homens Que Odeiam as Mulheres»). A lista completa dos vencedores pode ser consultada neste link.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

«Amor», de Michael Haneke (2012)

Há dias publiquei um post dedicado a «Le Havre», o mais recente filme de Aki Kaurismaki, com o título «Afinal ainda se fazem filmes assim», a propósito da sua simplicidade e beleza, tão ao gosto do Cinema do finlandês. O mesmo título quase (e sublinho o quase) poderia ser aplicado a uma crítica sobre «Amor», não fosse o filme de Haneke muito mais complexo do que à partida parece. Mas é, sem sombra de dúvidas, A (assim mesmo, com A maiúsculo) estreia desta semana e muito provavelmente o melhor filme que passará pelas nossas salas até ao final deste ano. Sem contar com o regresso de «A Mulher Que Viveu Duas Vezes», obviamente, mas isso é outra conversa.

Vencedor da Palma de Ouro na última edição do Festival de Cannes, o novo filme de Michael Haneke acompanha a história de George (Jean-Louis Trintignant) e Anne (Emmanuelle Riva), um casal de idosos pertencente à classe alta, a partir do momento em que Anne sofre um ataque e começa a perder aos poucos as suas capacidades. «Amor» podia ter sido apenas mais um melodrama sobre as agruras do envelhecimento e como um homem trata da sua mulher, o amor da sua vida (calculamos que de sempre, nunca chegamos a saber).

Mas num filme do austríaco as coisas nunca são assim tão simples. A câmara de Haneke volta a funcionar, como aconteceu em tantos outros filmes do realizador, como o nosso próprio olhar invasor para dentro daquelas duas vidas. Literalmente. Não há mais nada para lá do apartamento de George e Anne (tirando uma breve sequência no início do filme) e as restantes personagens parecem, tal como nós, voyeurs da situação do casal. Obrigadas a assistir ao desenrolar da situação, lidando da melhor forma possível com a mesma, muitas vezes sem saber como, e tentando confortar George na sua nova condição. Como às tantas diz George à filha (que nesta cena em específico até podia ser um de nós, espectadores do filme), em mais uma daquelas provocações tão ao jeito de Haneke, «estas coisas não são para ser vistas». Mas Haneke insiste em mostrá-las e ninguém resiste a desviar o olhar e sente a necessidade de ver como está Anne. Mesmo sabendo à partida que não vai gostar do que vai ver ou se sentirá desconfortável.

São estes pequenos detalhes que fazem a marca do realizador austríaco, que consegue analisar, como poucos cineastas nos dias de hoje, os sentimentos humanos de uma forma fria, sem cair no óbvio ou em mostrar as coisas de forma demasiado chocante. E em certas sequências «Amor» é duro de engolir, pois não sabemos em que posição gostaríamos de estar (na de George ou na de Anne) ou mesmo o que fazer naquela situação, que inevitavelmente nos poderá acontecer um dia. No final tudo se resume a uma bela história de amor, daquelas que pensamos já não existir nos dias de hoje, em que o que é bom hoje amanhã já não interessa para nada.

Não poderia terminar este post sem destacar a (enorme) interpretação dos dois protagonistas. Jean-Louis Trintignant, que regressa aos ecrãs depois de um afastamento voluntário do Cinema que durou quase uma década, é o que passa mais tempo no ecrã, mas o desempenho de Emmanuelle Riva é um daqueles que ficará como um dos melhores e mais marcantes do ano. Poucos actores serão capazes de se expor tanto como a protagonista de «Amor» o faz neste filme. E um filme que trata o Amor e o envelhecimento sem cair num tom de excessivo melodramismo não merece passar ao lado de ninguém. Quanto mais não seja para pensarmos a sério nestas coisas e não empurrá-las para debaixo do tapete. O que, no fundo, é o que Michael Haneke nos propõe na maioria dos seus filmes. E este não é excepção.

Classificação: 4/5