quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Mata-os Suavemente, de Andrew Dominik (2012)


Se há frase que melhor pode resumir «Mata-os Suavemente» esta será «it's all about the money». Na mais recente obra de Andrew Dominik, que em 2007 tinha realizado o western «O Assassínio de Jesse James Pelo Cobarde Robert Ford», o dinheiro ocupa um lugar de destaque. Podíamos estar perante um simples filme de gangsters que começa pelo planeamento de um golpe que tinha tudo para dar certo: assaltar um jogo de póquer ilegal bem frequentado por mafiosos cheios de dinheiro e pôr a culpa num chico esperto que já tinha feito algo semelhante no passado. Mas o assalto cheira tão mal como os dois assaltantes escolhidos para o desempenhar, cuja inteligência não é o mais forte, e o assassino profissional Jackie Coogan (Brad Pitt) é chamado para descobrir quem foi o verdadeiro autor do esquema. O enredo parece simples, mas não é, pois às tantas toda a gente quer saber onde está o dinheiro e as ligações entre os criminosos começam a vir ao de cima. A falta de inteligência de alguns leva os outros a aproveitarem para ganhar a vida.

Mas aos poucos «Mata-os Suavemente» torna-se mais uma reflexão sobre o sonho americano e o estado da economia nos dias de hoje (partindo da crise dos bancos nos EUA que surgiu no final do consulado de George W. Bush) e como todos nós vivemos para o dinheiro, independentemente da nossa profissão, do que um filme sobre um assalto que podia ter corrido melhor. Não é à toa que em pano de fundo, nos noticiários, vamos ouvindo os principais protagonistas envolvidos na tentativa de resolução da dita crise, incluindo o discurso de Barack Obama na noite em que venceu as primeiras eleições para a Casa Branca, numa grande sequência que encerra com chave de ouro o filme.

Antes disso e para lá de todas as analogias sobre a economia, a terceira longa de Andrew Dominik consegue ser um filme cheio de estilo. Não tanto como «Drive - Duplo Risco», um filme com mais estilo do que sumo para espremer, mas um filme com estilo. A responsabilidade não é tanto de uma realização competente, que é de facto, com a utilização da câmara a destilar estilo por todos os cantos (atente-se à cena do primeiro espancamento de Markie Trattman) sem cair no exagero do filme de Nicolas Winding Refn, mas de uma excelente galeria de personagens, cujos diálogos maravilham quem gosta de filmes de gangsters. Desde o Jackie Coogan de Brad Pitt (numa excelente interpretação) aos vários secundários que integram esta rede de criminosos que fazem parte de uma autêntica economia que vive às margens da lei e se rege com base em princípios empresariais, como diz às tantas uma das personagens, e também sofre com a crise. Os tempos são outros, diz a mesma personagem, que serve de elo de ligação entre Coogan e a 'organização' que o contrata para resolver os seus problemas. Cada uma destas personagens (e nem sequer referi o genial Mickey de James Gandolfini) merecia um post para analisar os diversos elos desta cadeia.

«Mata-os Suavemente» é mais um daqueles estranhos filmes sobre a crise e como esta acaba por afectar todos os sectores da sociedade. Neste caso os pequenos criminosos, para quem o dinheiro serve para tentar escapar a uma vida miserável, perseguindo o tal sonho americano e as supostas oportunidades que todos têm direito a ter, seja qual for o custo. No fundo é apenas isso que os autores do golpe queriam no início do filme, apesar de cada um ter em mente objectivos diferentes. Incluindo abrir um negócio (nem por isso legítimo, mas sempre é uma ideia de negócio), dando largas a um espírito empreendedor tão ao gosto dos dias de hoje. E um filme que dá que pensar na forma como o dinheiro, afinal tudo gira em torno do vil metal, do início ao fim de «Mata-os Suavemente», tomou conta do mundo.

Classificação: 4/5

6 comentários:

  1. soube-me a pouco.
    queria pelo menos mais uma meia hora de filme

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    1. :) o trailer prometia muito e eu até ia com as expectativas demasiado em alta. Não achei um filme excepcional, mas é um bom filme e não fiquei muito desiludido.

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  2. Gostei bastante do filme, mas não é um filme que agrade a todos também. É aí que brilha mais, a abordagem, o dizer é isto e pronto, um quase: in your face!

    cumprimentos,
    cinemaschallenge.blogspot.com

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    1. O filme tem muito mais para esmiuçar do que propriamente aquilo que vemos. É essa a mais valia dele e está muito bem conseguido, para lá de todo o estilo que encontramos à nossa frente. E o que tem a dizer, como bem referes, é dito de forma seca e 'in your face' (para usar a tua expressão) naquele diálogo final entre o Jackie e a personagem interpretada pelo Richard Jenkins. Está tudo aí.

      Cumprimentos

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  3. Concordo em pleno com a tua avaliação. Gostei bastante do filme, mas nem sequer reparei tanto no estilo, que tanto referes. Penso que para mim a mais-valia é mesmo os diálogos e as interpretações. O paralelo com o estado da Nação é outro ponto bastante interessante.

    Cumprimentos cinéfilos

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    1. Bem-vinda e obrigado pelo comentário. O estilo nota-se sobretudo em algumas das sequências de 'acção', se assim se podem chamar, como quando a personagem do Brad Pitt mata os seus alvos, sobretudo o primeiro, com aquela câmara lenta. Mas sim, claramente esse paralelo entre o estado da economia e aquele universo é o que está mais bem conseguido.

      Cumprimentos cinéfilos

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